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Chocolate de alta qualidade prospera no meio da floresta em reserva amazônica

by Chris Arsenault e Karla Mendes
Wednesday, 14 June 2017 14:59 GMT

Um agricultor seca grãos de cacau na reserva extrativista Arapixi, no estado do Amazonas, para serem exportados para a Alemanha como chocolate ambientalmente sustentável, em 31 de maio de 2017. Thomson Reuters Foundation/Chris Arsenault

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Chris Arsenault e Karla Mendes

 

RESERVA ARAPIXI, Amazonas, 14 de junho  (Thomson Reuters Foundation) - Com um cigarro na mão e um facão lamacento na outra, Maria Nobre de Oliveira acredita que o chocolate de alta qualidade ajudará a acabar com a epidemia de desmatamento que assola comunidades amazônicas como a dela.

 

A comunidade onde mora Oliveira é composta por algumas dezenas de casas de madeira feitas à mão, sem eletricidade ou água corrente, na maior floresta tropical do mundo, a mais de seis horas de barco da cidade mais próxima do sudoeste do Amazonas, Boca do Acre.

 

Moradores de comunidades  isoladas da Amazônia dizem que têm poucas oportunidades de ganhar seu sustento sem desmatar para criar gado - parte da razão pela qual as taxas de desmatamento da Amazônia no Brasil subiram 29% em 2016, após anos de declínio.

 

Assim como os habitantes de comunidades isoladas desmatam a terra ter um meio de sustento, grandes fazendeiros e especuladores tentam invadir a reserva extrativista Arapixi, onde Oliveira vive, para derrubar árvores, disse um funcionário do Ministério do Meio Ambiente do Brasil.

 

Mas os moradores da reserva têm um novo aliado para ajudá-los a proteger as árvores - o chocolate.

 

"Esta é uma floresta virgem", disse Oliveira, de 62 anos, à Thomson Reuters Foundation, enquanto moradores usavam longas varas para derrubar frutos de cacau - o ingrediente básico para fazer o chocolate - das árvores da reserva.

 

"Uns homens vieram aqui um tempo atrás para derrubar as árvores - mas falamos para eles irem embora", disse Oliveira, conhecida na comunidade como Dona Graça, enquanto outros agricultores levavam grãos de cacau frescos para secar ao sol.

 

"Se a gente tivesse deixado, a gente não teria uma fonte de renda ... o cacau nos ajuda a proteger a floresta."

Os agricultores da reserva extrativista trabalham para uma cooperativa de Boca do Acre, que administra a venda e a exportação do cacau.

 

EM BUSCA DE EQUILÍBRIO

 

Encontrar um equilíbrio entre o emprego para a população local e a proteção das florestas da Amazônia desafia há tempos governantes e legisladores.

 

A cada minuto, uma área de selva equivalente a dois campos de futebol é derrubada na Amazônia, de acordo com o ex-diretor do serviço florestal do Brasil.

 

Técnicos do governo brasileiro dizem que projetos como a cooperativa de cacau estão ajudando os moradores a viverem da terra sem desmatar.

  

"Esses projetos de cacau vêm da comunidade, somos parceiros deles", disse Abílio Ikeziri, funcionário do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), responsável por áreas protegidas.

 

A renda também ajuda os moradores a manter os fazendeiros e os grileiros fora da reserva, disse Ikeziri.

 

"Eu sou o único (funcionário) responsável para monitorar (uma reserva) de 1,5 milhão de hectares (15.000 km quadrados) de terra - é impossível (sem ajuda local)", disse ele à Thomson Reuters Foundation.

 

As comunidades que moram na reserva e vivem de extrativismo vegetal sustentável, como o cacau nativo, auxiliam o trabalho dos funcionários na defesa da terra contra especuladores, disse Ikeziri.

 

SOLUÇÕES COOPERATIVAS

 

Na reserva de Arapixi, os moradores costumavam colher cacau para consumo próprio e começaram a vender a produção para uma cooperativa há 10 anos.

 

No ano passado, eles exportaram mais de 10 toneladas de cacau nativo para a Europa, o que rendeu à cooperativa cerca de R$ 130 mil reais, uma queda em relação aos anos anteriores devido a más condições climáticas.

 

Uma vez que chega à Alemanha, o cacau é transformado em chocolate de alta qualidade, certificado ambientalmente.

 

Com sede no porto fluvial de Boca do Acre, a cooperativa emprega mais de 400 pessoas, incluindo uma dezena na comunidade de Oliveira, disse o gerente José Geraldo Tranin.

 

"Antes de lançarmos a cooperativa, muitas pessoas estavam desmatando a terra para criar gado", disse Tranin à Thomson Reuters Foundation no pequeno escritório da cooperativa em Boca do Acre. "Agora as pessoas sabem que o cacau gera renda, então elas estão preservando a floresta".

 

Com a ajuda de empreendedores sociais alemães que forneceram dinheiro para a compra de barcos e outros ativos para a cooperativa começar a funcionar, moradores da reserva como Oliveira receberam treinamento para a produção de cacau e ferramentas para colher e transportar a colheita de maneira adequada.

 

"A cooperativa quer expandir, então isso é bom pra nós", disse o fazendeiro José Freitas, de 52 anos, fazendo um intervalo entre a secagem de grãos de cacau sobre uma grade de metal ao sol.

 

COMPROVADO POR PESQUISAS

 

Os moradores da reserva ganham até R $ 1,2 mil por mês na época da safra, preparando os grãos para exportação - um salário razoável em uma região assolada pela pobreza - embora isso signifique trabalhar sete dias por semana.

 

"A gente pode comprar mais comida agora", disse Freitas. "Eu consegui até pagar o transporte para ir ao hospital."

 

Para os consumidores europeus, o chocolate da reserva Arapixi recebe a marca de "cacau silvestre do Amazonas".

 

O projeto teve um impacto direto na preservação da floresta em Arapixi, em comparação com reservas similares da Amazônia, disse Francidalva Oliveira de Souza, pesquisadora da Universidade do Estado do Amazonas que estuda o projeto.

 

"O desmatamento tem diminuído nessa reserva", disse Souza à Thomson Reuters Foundation em uma entrevista por telefone.

 

"Esse tipo de projeto pode ser expandido para ajudar a preservar outras áreas e ajudar os moradores a obter renda."

 

* A Society of Environmental Journalists (SEJ) forneceu suporte financeiro de viagem para essa reportagem

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